Em 1944, Leônidas da Silva na decisão do Campeonato Municipal de São Roque; o Diamante Negro deu o pontapé inicial – O Democrata

A final do Campeonato Municipal de São Roque de 1944 teve um espectador ilustre. Leônidas da Silva, um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro, marcou presença no jogo em que o São Bento conquistou o título diante do Atlético, no Campo da Brasital, atual Paulistano. Leônidas deu o pontapé inicial “sob frenéticos aplausos”.

Os dois grandes rivais do futebol de São Roque, entre 1918 e os anos 1940, fizeram um duelo registrado com detalhes no Jornal O Democrata, na edição de 27 de maio de 1944. A partida foi disputada no domingo anterior (21), “o São Bento saiu vitorioso por 1 a 0, o cetro [bastão que representa o símbolo do poder] do Campeão Municipal continua em poder do consagrado verde e branco”.

São Bento campeão municipal de São Roque contra o Atlético. Jornal O Democrata (27/05/1944)

Na sequência, o registro da presença do craque, que estava em plena atividade no São Paulo Futebol Clube: “Leônidas! Sim, Leônidas, o consagrado avante do São Paulo e campeão sul-americano [sic], esteve presente nesta grande partida. Chegaram nesta cidade, em companhia de Leônidas, os senhores Vergílio Tatini (presidente do Departamento de Juízes da Federação Paulista), Pedro de Souza (secretário do mesmo departamento) e o árbitro Antenor Ávila. O delegado de Polícia, Francisco da Cunha Nogueira, discursou aos jogadores e ao Diamante Negro antes do início da peleja.”

Apesar da citação, Leônidas não foi campeão sul-americano.

A vinda de Leônidas a São Roque demonstra mais uma vez que, a partir de uma notícia, é possível fazer uma viagem pelo tempo e entender a importância da ilustre visita. Nascido em 6 de setembro de 1913, Leônidas estava com 30 anos e vinha da conquista do título paulista no ano anterior, quando o Tricolor saiu de uma fila iniciada em 1931. Nesse período, o Palestra/Palmeiras ganhou seis títulos (1932, 1933, 1934, 1936, 1940 e 1942), contra quatro do Corinthians (1937, 1938, 1939 e 1941) e um do Santos (1935). Costumava-se dizer que o campeão seria o Palmeiras ou o Corinthians, dependendo do lado em que a moeda caísse. Em 1943, como está em uma faixa exposta nos dias de hoje no Morumbis, “a moeda caiu em pé”. Graças às mãos de King e aos pés de Piolim e Vírgílio; Zezé Procópio, Zarzur e Noronha; Luizinho, Sastre, Leônidas, Remos e Pardal. Técnico: Joreca. Em 1944, o Palmeiras voltou a ser campeão, mas Leônidas levaria o São Paulo à conquista de mais quatro títulos estaduais (1945, 1946, 1948 e 1949).

“Sim, Leônidas em São Roque.” O consagrado avante do São Paulo esteve presente na partida entre São Bento e Atlético. Jornal O Democrata (27/05/1944)

Disputou duas Copas do Mundo. Em 1934, na Itália, anotou o gol do Brasil no único jogo (mata-mata na primeira fase) contra a Espanha, derrota por 3 a 1. Na França, em 1938, Leônidas foi eleito o melhor jogador do mundial e o artilheiro da competição, com 7 gols. Nas semifinais, contundido, não jogou na derrota para a Itália (que ganharia o segundo mundial seguido), voltando na vitória da disputa do terceiro lugar contra a Suécia. O Brasil ganhou por 4 a 2 e ele marcou dois gols. Encantou o mundo e ganhou da imprensa francesa o apelido de Diamante Negro. A fábrica de chocolates Lacta percebeu a popularidade do craque e rebatizou a barra de chocolate ao leite crocante de Diamante Negro.

Ele não foi o criador da “bicicleta”, mas tinha tanta habilidade para jogar o corpo para o ar e, de costas, chutar a bola que ganhou o apelido de Homem-Borracha. Em 1941, brigou com a diretoria do Flamengo, passou por uma cirurgia no joelho e ficou preso oito meses, acusado de ter falsificado o alistamento militar em 1935. Vivia um momento difícil quando Paulo Machado de Carvalho (diretor de futebol do São Paulo) decidiu apostar na contratação do jogador mais famoso do Brasil. O dirigente foi criticado e ouviu que tinha contratado “um bonde de 200 contos de réis”. A resposta veio quando Leônidas parou deitado no ar contra o Palmeiras, e o locutor Geraldo José de Almeida (Rádio Record) gritou: “De bicicleta! De bicicleta! O bonde de 200 contos de réis marcou de bicicleta!”

Leônidas e gol de “bicicleta” contra o Palmeiras; pela habilidade na execução do lance ganhou o apelido de Homem-Borracha. Foto reprodução

Poderia ter disputado as copas previstas para 1942 e 1946, mas a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) cancelou as competições. Naquela tarde em que esteve em São Roque, aproveitando alguns dias de folga no Campeonato Paulista, o Diamante Negro ainda sonhava com a Seleção Brasileira. Talvez tenha decidido acompanhar os amigos em um jogo de futebol amador para refrescar um pouco a cabeça. Alguns dias antes (14 e 18 de maio), a seleção fez dois amistosos contra o Uruguai. Por sinal, únicos jogos do Brasil naquele ano: 6 a 1, em São Januário; 4 a 0, no Pacaembu. Leônidas não foi convocado, mas lá estavam os companheiros de clube Zezé Procópio, Noronha e Luizinho; Oberdan e Eduardo Lima (Palmeiras); e Begliomini (Corinthians). Além do próprio técnico do São Paulo, o português Joreca, que dividiu o comando da Seleção Brasileira com Flávio Costa.

Consagrado na Copa de 38 com o título de Diamante Negro; Leônidas inspirou o lançamento de um chocolate que está no mercado há quase 100 anos

O problema era justamente Flávio Costa, com quem teve problemas de relacionamento desde os tempos do Flamengo. Ao ser cortado às vésperas do Campeonato Sul-Americano de 1949, o jornal O Mundo Esportivo (29/04/1949) estampou na manchete a declaração do craque, que viria a se confirmar: “Eu acuso! Com Flávio Costa, o Brasil ganhará o Sul-Americano, mas perderá fatalmente a Copa do Mundo”. Em 1950, Leônidas viu de perto o “Maracanazo”, com a vitória do Uruguai por 2 a 1. No entanto, já estava em uma nova função: comentarista de futebol na Rádio Panamericana (atual Jovem Pan), a convite do amigo Paulo Machado de Carvalho.

Voltando à decisão do Campeonato Municipal de 1944, Leônidas elogiou o desempenho dos jogadores do São Bento e do Atlético. Disse ter assistido a uma partida com a mesma tensão nervosa com que se assiste a um Palmeiras e Corinthians. “São jogos de rixas, ou seja, são dois bicudos que se enfrentam.” Leônidas faleceu em 24 de janeiro de 2004, aos 90 anos, em Cotia. Sofria do Mal de Alzheimer e estava internado em uma clínica geriátrica.

Vander Luiz

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