Eu vou morrer nas proximidades do Silvio Santos | O Democrata

Em 1947 embarquei para o Rio de Janeiro, onde fui trabalhar no Asilo São Luiz para a Velhice Desamparada, sediado no bairro do Caju. Ali conheci Gastão Bilac, irmão do famoso poeta Olavo Bilac, Landell de Moura, o introdutor da radiofonização no Brasil, além de outros famosos com os quais mantive relâmpaga amizade.

Primeiro eu fui um simples office-boy. Depois prático de farmácia. A seguir, um especialista em escritório da velhice.

Era comum, muito comum, quando lá comecei, levar um, dois, e até três velhinhos falecidos de madrugada, da enfermaria ou dos quartos para o necrotério. É que, bastava o clima esfriar um pouquinho e lá iam alguns velhinhos para o cemitério.

Lá existiam uns duzentos internados e bastava o clima mudar um pouco para que alguns viventes se despedissem para sempre. Quando eu passei a trabalhar no escritório central do asilo, eu viajava todos os dias de bonde do bairro do Caju para o centro da cidade. E nessas minhas idas e vindas, eu cruzei muitas vezes com famosos. Um deles foi o Silvio Santos, que então era um simples camelô. Não raro, nas calçadas da Rua da Carioca, Praça Quinze de Novembro, Avenida Rio Branco, nas Barcas, eu encontrava o Silvio Santos e outros camelôs que vendiam bugigangas por preços aceitáveis, muitas e muitas vezes eu comprei alguma coisa dele, afinal ele era chamativo e ótimo vendedor.

Em 1952, voltei para São Roque, onde me empreguei como cartorário e oficial de justiça. Por coincidência, na mesma época, o Silvio Santos também veio para cá, isto é, para o estado de São Paulo, onde ele se tornou radialista e depois apresentador de televisão, com crescente simpatia.  Foi aí que eu o reconheci como sendo o simpático camelô do Rio. É que lá no Rio eu o vi várias vezes na Rua do Senado ou Senador Dantas, onde ele morou.

Então, passei a acompanhar seus passos. Cheguei a enviar sugestões para os seus programas, mas apenas uma delas foi aproveitada: uma brincadeira no Programa do Ratinho com as participações de Otávio Mesquita, Murilo e outros.

Ele, o Silvio, tem a minha idade, que é 90 anos. Foram tantas as coincidências entre nós, que eu e ele vamos morrer nas proximidades, isto é, um perto do outro, perto, no caso, não é de distância e, sim, de registro calendário, de 5, 10, 15, 25 anos ou mais. Se é ele que “vai” primeiro ou eu, ninguém sabe. Ele já sofreu várias cirurgias, algumas para se “renovar” e outras por necessidades. Eu, afora cirurgias na visão, tenho saúde de ferro, não obstante meus médicos já me alertaram: “Jayme, ferro também enferruja…”

A verdade é que tanto eu como o Silvio Santos já fizemos o que tínhamos que fazer aqui. Agora, a morte poderá ser um “prêmio”.

Era comum, muito comum, a polícia e a fiscalização municipal surpreender os camelôs quando eles estavam em atividade, nas ruas, e apreender as mercadorias que eles vendiam. Num dos casos que eu presenciei foi o seguinte: Um camelô, ao fugir, derrubou umas 50 coxinhas e sanduíches na calçada, com prejuízo total. É que, como eles tinham vigilantes, assim que um destes gritava “Olha o rapa”, todo mundo fugia e nem sempre dava tempo de recolher e escapar com tudo. É que eles vendiam, claro, sem pagar impostos.

Esclareço que “nas proximidades”, dito no título deste artigo, é de anos, e não de distância.

Por fim, não posso negar: ele e eu somos dois vencedores, embora com resultados bem distanciados.

Para quem não se lembra, ou não sabe, esclareço que já fui plagiado pelo novelista da TV Globo, Lauro César Muniz, num artigo que escrevi e que foi publicado pelo “nosso” Democrata, sobre a terrível doença que foi a Aids. É que o “meu” doente era fictício, falso, só para alertar a juventude de então; ao passo que o dele, do novelista, era o seu próprio filho, publicado na Revista Claudia, em 1991. Os títulos dos dois artigos eram estes: “O Diário de um Aidético”, o meu; e “O Adeus de um Aidético”, o dele. 

Nossa gratidão, a vocês, Sr Airton, Dona Rose, Tati, pais e filha de uma exemplar família, bem como do jovem Farle, futuro participante de todos, nosso reconhecimento pelo que têm feito. A você, Cris, “auxiliar” do prefeito Guto Issa e do vice Maique, administradores de São Roque, também nossa gratidão pelo que estão fazendo e ainda vão fazer. Afinal estamos só começando…

Jayme Alvarez de Oliveira

Jornal O Democrata São Roque

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