Quilombo do Carmo luta pelo reconhecimento de suas terras e acesso à infraestrutura | O Democrata
Foto: Revista Forum

No município de São Roque, mais precisamente na região do Carmo, um remanescente quilombola luta para conseguir a regularização de suas terras e acesso às infraestruturas básicas.

O Quilombo do Carmo é amplamente registrado historicamente e considerado o quilombo com mais registros do Estado de São Paulo, de acordo com alguns especialistas. As famílias instaladas são descendentes diretas de pessoas que foram escravizadas por fazendeiros e pela Ordem dos carmelitas fluminenses (atual Província Carmelita de Santo Elias) que possuía terras na região.

Apesar de a área ter historicamente 5 mil hectares entre São Roque, Cotia e Ibiúna, atualmente, o local em disputa apresenta 15 hectares, organizados em uma vila pequena, com construções crescendo em lajes e quintais, sendo a grande maioria sem escritura.

A redução do espaço ocorreu ao longo das últimas décadas e aconteceu por causa da entrada de empreendimentos imobiliários e da precária regularização fundiária.

Associação ameaçada com falso líder quilombola

Desde 2017, uma retomada de terras ocorre na região, em uma área de 9 hectares requisitada pelo Incra para a delimitação do território quilombola, com famílias que retornavam de Vargem Grande Paulista para reocupar seu território ancestral. Tais famílias já foram certificadas como quilombolas em documentos recentes do Incra após pedido do Ministério Público Federal. Desde então, os moradores do quilombo vem travando uma luta contra um grupo com influência no âmbito político municipal que tenta desmantelar a associação local e enfraquecer a luta pela terra. Reintegrações de posse da Prefeitura de São Roque e do maior loteador de terras para fins de condomínio da região foram negadas pela justiça federal.

De acordo com informações levantadas pela reportagem da Revista Fórum, algumas pessoas tentaram descaracterizar a atuação da Associação Quilombo do Carmo, uma associação criada no bairro, mas onde não eram realizadas eleições u que por isso estava irregular com dívidas fiscais.

Segundo a Revista Fórum

A Associação então passou a articular com moradores de um loteamento local e com um vereador de São Roque, quando segundo testemunhas que estavam presentes, o então presidente levava informações caluniosas sobre pessoas do quilombo e seus apoiadores, sem apresentar provas.

Por meio dessas articulações, houve a tentativa de evitar que a luz fosse ligada em novos pontos no quilombo e coagindo os quilombolas através da prefeitura e guarda municipal, em diversos eventos que foram denunciados pelos quilombolas. Um desses assédios resultou em um processo contra uma liderança quilombola, Altamiro de Araújo, por supostamente ter desobedecido a embargos de obras por ordem da prefeitura.

Mesmo assim, a Defensoria Pública do Estado, através dos defensores Andrew Toshio e Isadora Brandão, entraram em processo contra a CPFL, distribuidora de energia, e conseguiram que a luz fosse ligada, após três anos com apenas um relógio de luz para 50 famílias.

Em outubro de 2018, a Prefeitura negou-se a ceder a escola municipal do bairro, chamada de Rabindranath Tagore, para a realização da reunião do Incra onde se definiriam os limites do território quilombola. Desmarcada na última hora, sem justificativa plausível, buscava inviabilizar o evento. A reunião ocorreu na ocupação, lotada de quilombolas e com a presença de procuradores, defensores e da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas).

Votou-se ainda pela ampliação do território, pensando nos quilombolas do bairro, no desejo que todos tivessem muito espaço, e uma imensa lista de quilombolas assinaram um abaixo-assinado legitimando os trabalhos do Incra.

Após o episódio, surgiu um abaixo-assinado contra o quilombo, pedindo a suspensão dos estudos do Incra. A lista foi encaminhada ao Incra pelo próprio motorista da câmara municipal, conforme pode-se verificar no portal da transparência. Segundo um morador do Carmo que não quis se identificar “não sabia que o conteúdo da carta era esse. Jamais desejaria o fim da luta”.

Isaque da Cruz, liderança quilombola da ocupação diz que “dezenas de famílias do bairro estão perdendo a chance de ter uma terra que é de seu direito por seus ancestrais terem sido escravizados, uma terra eterna para seus filhos, netos e bisnetos. Trocam a verdadeira liberdade que é essa terra, para virar empregados em casa de famílias em condomínios, manipulados para pensar assim, mas também por receio de serem perseguidos”.

Envolvimento de moradores do Condomínio Patrimônio do Carmo

Um ex-presidente do Condomínio Patrimônio do Carmo e hoje líder de um grupo minoritário, com cerca de 6 associados, em dezembro de 2018, enviou um e-mail com cópia para a Prefeitura de São Roque, Polícia Civil e Casa Militar com uma série de acusações graves contra a ocupação quilombola. O e-mail apareceu na defesa de um processo que uma moradora do loteamento sofre; Lucimar Takaoka, por ter supostamente (pois ainda não está transitado em julgado) difamado um apoiador do quilombo.

O fato gerou revolta, pois nesse e-mail evidenciava-se o que muitos suspeitavam, mas não tinham provas, do papel de articulador político desse grupo (que envolve políticos locais e antiga associação) em caluniar, difamar e destruir a luta quilombola, estimulando ações policiais a partir de falsas denúncias.

O e-mail já foi enviado para o Ministério Público de São Roque e para o Ministério Público da capital, onde o procurador Gilberto Nonaka, solicitou que eventuais providências sejam tomadas. A Defensoria Pública, na figura do Defensor Andrew Toshio, também recebeu a denúncia e estuda com o Núcleo Especializado de Defesa da Diversidade e Igualdade Racial, instaurar processo.

A atual gestão do loteamento Patrimônio do Carmo, a AREPC, declarou que a opinião do ex-presidente não representa a maioria dos associados e que ele não fala em nome da associação e não faz parte de qualquer quadro da direção. Declaração semelhante foi dada pela presidente do conselho do loteamento em reunião no mês de setembro. Clarissa Barth, presidente atual do loteamento (para a Forum) disse que não existe qualquer relação entre assaltos, aumento de violência e a ocupação quilombola.

As lideranças da ocupação, Isaque e Altamiro, opinam que “se tem quilombola que são aceitos como legítimos para a Casa Grande, eles jamais estarão nas mesmas fileiras que a gente”.  Para eles “A luta quilombola é uma questão histórica, negra e de classe, mas quem defende a luta quilombola de fato é quem respeita seus princípios coletivos e não quem se alia com os algozes. O quilombo triunfará e a história registrará quem lutou e quem traiu a causa, cuspindo no sofrimento dos ancestrais escravizados”.

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